quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Enter the Void Press Conference

Um frances de origem argentina que faz filmes interessantes dá, também, entrevistas interessantes.

CIDADE DE NEON Enter the Void

No filme ‘Enter the Void’ as cenas de sexo são baseadas no Livro Tibetano da Morte. Este é o ponto de referencia onde a alma, pronta para renascer, irá ver muitas pessoas fazendo sexo, pois precisa escolher seus pais.  Os efeitos especiais são mais intensos porque a mente (lembranças) de Oscar está começando a apagar e as coisas vão ficando desorientadas e loucas.


quarta-feira, 2 de novembro de 2011

GASPAR EM pOA


quinta-feira, 27 de outubro de 2011

ENTER THE VOID

GASPAR NOE, 2009

He shocked us all with Irréversible, and Gaspar Noé's latest is a magnificently deranged melodrama, says Peter Bradshaw, guardian.co.uk

It has been eight years now since Gaspar Noé released his notorious rape-revenge film Irréversible, an ultra-violent, ultra-extreme movie that effortlessly exceeded in shock value anything, by anyone, at any time. I myself, having admired his previous feature, Seul Contre Tous, reacted fiercely against it as a piece of macho provocation. Rereading my review now, I find none of its points wrong exactly, but I have to concede the possibility that I was just freaked out in precisely the way Noé intended. Having staggered out of the auditorium, my eyeballs still vibrating from the director's trademark sado-stroboscopic white light display, I may well have succumbed to a convulsion  of disapproval.

Enter the Void is, in its way, just as provocative, just as extreme, just as mad, just as much of an outrageous ordeal: it arrives here slightly re-edited from the version first shown at Cannes. But despite its querulous melodrama and crazed Freudian pedantries, it has a human purpose the previous film lacked, and its sheer deranged brilliance is magnificent. This is a grandiose hallucinatory journey into, and out of, hell: drugged, neon-lit and with a fully realised nightmare-porn aesthetic that has to be seen to be believed. Love him or loathe him – and I've done both in my time – Gaspar Noé is one of the very few directors who is actually trying to do something new with the medium, battling at the boundaries of the possible. It has obvious debts, but Enter the Void is utterly original film-making, and Noé is a virtuoso of camera movement.

We get the classic Noé tropes: throbbing ambient soundscape, murky lighting design bursting into unwatchable vortices of dazzling, flickering light, explicit sex and violence, colossal sans-serif lettering for the title- and end-credits. This film, however, has a new motif: what we see is purely the point of view of its leading figure; we watch everything through his eyes. He is a small-time drug-dealer called Oscar (Nathaniel Brown). Irréversible had a horrific club called the Rectum; this one has a bar in Tokyo called the Void, where Oscar is shot by cops. His spirit hovers over the city, an unquiet ghost unable or unwilling to leave, watching over his sister Linda (Paz de la Huerta), a pole-dancer now utterly alone in the world.

This brother and sister have a strange and tragic story, which might in other circumstances have interested authors like Ruth Rendell or PD James: orphaned as kids, they were fostered separately, and on becoming 18, the older child Oscar apparently enters into some modest trust-fund inheritance which enables him to travel to Tokyo – a long-lost childhood longing for exotic travel – and later makes enough through drugs to bring his adored sister over, and live with her in an atmosphere of   incestuous yearning.
He revisits in horrified anguish, primal scenes from his childhood, including the death of his parents in a car wreck, which has seeded in Oscar this obsessive closeness to his sister and a sexualised longing for his lost mother, which finds expression in an affair with an older woman in Tokyo. Through some bizarre karmic influence, Oscar's spirit now sets out to part Linda from her current boyfriend, sinister tough guy Mario (Masato Tanno) and to get her together with his friend Alex (Cyril Roy), an amiable, dishevelled artist and the nearest thing this film has to a normal, sympathetic human being.

Oscar's dead-man floating-eye view gives us a ringside seat at scenes of unending horror, violence, squalor and pain. Yet there is a kind of barking mad spiritual dimension in Noé's film. Enter the Void is about life after death. Specifically, it's about the life after death that troubles all of us atheists and rationalists most of all: the life after death that we all believe in – other people's lives in this busy and unhappy world carrying on heedlessly after we are dead.

The POV-style changes as the film progresses. When Oscar is still alive, we see strictly what he sees, and the view is periodically impeded by his blinks – as the initial scenes continued, I found my own blink-rate coming into synch with Oscar's, and so this became invisible. His thinking mind is represented by a whispered, paranoid soliloquy. After his death, this falls silent and he sees the past partly impeded by the back of his own head.

Then, this disappears as his spirit floats everywhere and anywhere: death as the ultimate out-of-body experience. It's like a psychedelic innerspace version of Kubrick's 2001, and the film even finally presumes to offer a version of the star-child rebirth. Like Kubrick, incidentally, Noé has a fondness for trad classical – he brings Air on a G String on to the soundtrack. As for the overhead visions of violence and claustrophobic horror, they are clearly influenced by the climactic sequence of Scorsese's Taxi Driver.
Noé's most startling achievement in Enter the Void is his vision of Tokyo: he reimagines it as a branching, crystalline network of neon laid out starkly against the night sky. The city is never seen in daytime. It is not real, but has merged with an illusory vision of the neon-model created by an artist friend of Victor's, and it is also an architecturalised version of those spiralling, kaleidoscopic snake-shapes that Oscar sees while tripping.

Some may find Enter the Void detestable and objectionable, though if they affect to find it "boring" I will not believe them. For all its hysterical excess, this beautiful, delirious, shocking film is the one offering us that lightning bolt of terror or inspiration that we hope for at the cinema.

Thursday 23 September 2010
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Enter the Void
Production year: 2009
Countries: France, Rest of the world
Cert (UK): 18
Runtime: 150 mins
Directors: Gaspar Noe
Cast: Cyril Roy, Masato Tanno, Nathaniel Brown, Paz de la Huerta

domingo, 2 de outubro de 2011

A TRAMA CINEMATOGRÁFICA E SUAS CONEXÕES.

 
Escritor e crítico de cinema Enéas de Souza encerra o ciclo Olhares Por dentro da Trama. 

Aprimorar o entendimento das imagens e narrativas fílmicas tem se transformado em um recurso cada vez mais importante na educação, na publicidade, na vida digital e real. A imagem em movimento e o gesto no tempo são alguns das questões a serem desvendadas na oficina O Filme e Suas Conexões, com Enéas de Souza, sábados à tarde, de 15 de outubro a 5 de novembro, na sede da produtora Curta o Circuito (Azenha, 1676, sala 303). 

Segundo Enéas, o cinema como arte é um pensar através da imagem e do som, envolvendo uma narrativa, não necessariamente uma história, e que através da montagem e de seus vários blocos de imagem em movimento, desenvolve um ritmo, que é o ritmo da forma do cinema. O cinema é uma forma de pensar que dá a pensar, já dizia Godard. Contudo entre a forma de pensar e que dá a pensar há um intervalo, onde habita um pensamento que nem o cineasta nem o espectador são capazes de conhecer automaticamente. Isso quer dizer que o cinema expressa mais que o cineasta acha que filmou e que o espectador muitas vezes viu. Durante a oficina, falaremos sobre isso, o que não é automaticamente visível, mas essencial a arte cinematográfica, nossa relação com o mundo e vice-versa. 

‘O Filme e Suas Conexões’ é a sétima oficina do ciclo ‘Olhares por dentro da Trama', que já discutiu o roteiro, a direção, a fotografia, a trilha, a montagem e, agora, sobre todos esses elementos em conexão. 

Enéas de Souza é filósofo, economista e crítico de cinema. Membro da Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (ACCIRS) e autor do livro 'Trajetórias do Cinema Moderno', lançado em 1965 e reeditado duas vezes, sendo a última em 2007, quando inclui entrevistas e artigos inéditos. Os textos são marcados por análises que se aprofundam na teoria do autor e traçam paralelos entre o cinema e a filosofia. Na efervescente década de 60, Enéas participou da revista Filme 66 e do Jornal de Cinema do Clube de Cinema de Porto Alegre. É um dos organizadores do Seminário O Divã e a Tela, da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA), que acontece desde 2005. É um dos editores da Revista Teorema, hoje em seu número 18. Em agosto deste ano, lançou seu segundo livro: 'O Divã e a Tela'. Organizado em parceria com Robson Pereira, o livro é composto de textos originados de debates acerca de filmes dirigidos por Hitchcock, Ingmar Bergman, Bernardo Bertolucci, Orson Welles, Christopher Nolan, os irmãos Moreira Salles, além de ensaios sobre o cinema de José Padilha, entre outros. 

Olhares por dentro da Trama faz parte do projeto Olhares sobre o Cinema que acontece há quatro anos. O objetivo é debater sobre a arte, narrativas e técnicas. Este ano, o ciclo tem apoio da videolocadora E o Vídeo Levou, Apema e TVE. Inscrições pelo site www.curtaocircuito.art.br. Mais informações pelos telefones 3062-4370 e 93-272855, com Isabel.

CICLO OLHARES Por dentro da trama
O FILME e suas conexões, com ENÉAS DE SOUZA.
15 de outubro a 5 de novembro| sábados à tarde
Na produtora Curta o Circuito – Azenha, 1676/sala 303
Contato: 3062-4370 ou 93-272855, com Isabel

Outros textos relacionados a Enéas de Souza:
O Filme e sua conexões, programa.
Fernando Pessoa  
imprensa

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Programa oficina O Filme e Suas Conexões

Oficina O FILME E SUAS CONEXÕES
com o crítico Enéas de Souza
15 de outubro a 5 de novembro de 2011
Sábados| 14h às 17h


Objetivo

Analisar os elementos das oficinas anteriores no foco da crítica.
Qual crítica interna, do diretor. E da externa, o que escapa do diretor e o crítico percebe.
Sobre o envolvimento do filme com o mundo e a influência do mundo sobre o filme.

Programa

1) O cinema, a imagem, a crítica e a contemporaneidade;
2) A crítica interna e a crítica externa ao filme;
3) A imagem indispensável do nosso tempo.
    A sociedade do espetáculo: a imagem e a contra-imagem.
4) As múltiplas transições das imagens


Filmografia básica:

Além do "Poderoso Chefão" de Coppola
1) "Os Infliltrados" de Martin Scorcese
2) "Match Point" de Woody Allen
3) "Tropa de Elite II" de José Padilha
4) "Santiago" de João Moreira Salles
5) "Paranoid Park" de Gus Van Saint
6) "Pulp Fiction" de Quentin Tarantino

inscrições pelo site da produtora: www.curtaocircuito.art.br 

terça-feira, 20 de setembro de 2011

OS TRILHEIROS


O essencial é invissível aos olhos. Mas os ouvidos captam e desenvolvem pensamentos próprios.

Encerramento turma de trilha, da dir. à esq.: 
Mariana, Arthur, Roger, Suzane, Rodrigo, Carlos, Walter e Débora.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

iNVISÍVEL aos olhos, ESSENCIAL ao filme

Vicente Moreno ministra oficina sobre Montagem, nos sábados de setembro a outubro.

Quando assistimos a um filme, somos capazes de sentir as limitações físicas e angústias dos personagens. Quem nunca sofreu com uma corrida contra o tempo, do mocinho para salvar sua amada, amarrada aos trilhos do trem?  Pois o ritmo e intensidade das cenas são definidos na montagem, uma etapa invisível aos olhos, mas essencial ao filme. Assim, a Curta o Circuito, em parceria com o cineasta, Vicente Moreno, realiza a oficina de Montagem, sábados à tarde, de 10 de setembro a 1º de outubro.

Muitos dizem que um roteiro ruim pode ser salvo no processo de montagem. Da mesma forma que um bom roteiro pode se perder, se a montagem for precária. Como isso acontece? A proposta da oficina é desvendar estes e outros mitos e tornar palpável uma das mais essenciais etapas da realização cinematográfica. Os elementos fundamentais da montagem (narrativa, ênfase, ritmo e fluência) serão estudados a partir de diferentes vertentes históricas, refletindo sobre as ideias de pensadores como Eisenstein, Bazin e sobre o cinema contemporâneo.

Vicente Moreno é roteirista, diretor e montador, graduado em Realização Audiovisual pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), com especialização em roteiro e montagem. É professor do módulo de montagem e roteiro, no curso de Especialização em Cinema da mesma universidade. Atua no mercado audiovisual desde 2006 como roteirista, montador e diretor de longas-metragens, médias, curtas e programas para a televisão. É diretor dos curtas-metragens "Sem Sinal" (vencedor do prêmio Histórias Curtas 2009) e "Mãos Dadas”. Entre os longas-metragens, os mais conhecidos são “Ainda Orangotangos” (2007), como assistente de direção; “A Última Estrada Para Praia” (2010), como co-roteirista e assistente de direção, e "ABSOLUTO - Internacional Bicampeão da América", como diretor.

A oficina Montagem é a sexta, de uma série de sete, que compreendem o ciclo Por dentro da Trama. O ciclo visa à compreensão mais aprofundada sobre os elementos da linguagem cinematográfica. Com este foco realizamos as oficinas sobre o roteiro, a direção, a fotografia, a direção de arte, a trilha sonora e , agora, sobre a montagem.  ‘O filme e suas Conexões’, com Enéas de Souza, será a que encerra o ciclo, propondo uma análise crítica e filosófica sobre os assuntos anteriores. O projeto é uma realização da produtora Curta o Circuito e, neste ano, tem apoio da locadora E o Vídeo Levou, Apema Locações de Equipamentos e Televisão Educativa do RS, TVE. As inscrições são feitas pelo site www.curtaocircuito.art.br . Mais informações pelos telefones 3062-4370 ou 93-272855, com Isabel.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Uma boa Trilha

Arthur de Faria*

Uma boa trilha sonora pode ser duas coisas: pode ser aquela que quando termina o filme a gente nem se deu conta que tinha trilha, de tão perfeitamente adequada que é. Tão perfeitamente gerou tensão, encantamento, alegria, melancolia. E pode ser aquela que justamente te gruda na memória, com aquele tema que tu sai do cinema assoviando e, em alguns casos, nunca mais vai sair da tua cabeça. As duas possíbilidades caracterizam uma boa trilha sonora. Agora, uma trilha sonora genial é a que consegue o melhor dos dois mundos: grudar, antecipar sensações, mas estar ali sempre à serviço da imagem. Nem que seja causando estranhamento. Coisa de gênio. Gênio como o foram Nino Rota, Bernard Hermann. Como são Goran Bregovic, John Williams, Jerry Goldsmith.
 

*Jornalista, produtor, músico e ministrante do Ciclo Olhares. 

Nino Rota. 'Waltz' O Poderoso Chefão


sexta-feira, 1 de julho de 2011

Fernando Pessoa

A luxúria inventiva de Fernando Pessoa

Enéas de Souza *

A genialidade de Fernando Pessoa na história cultural do Ocidente se baseia em duas características fundamentais: (1) na produção inovadora de uma poesia, na qual nasce uma galáxia de poetas, os seus heterônimos; (2) na construção de uma postura cultural, onde sua poesia faz uma intervenção na área poética, mas igualmente se expressa e atinge o campo filosófico. Claro, existe uma terceira característica, tratando da posição do intelectual na sociedade contemporânea, que deixarei para outra oportunidade. Os dois pontos aludidos acima, que vão ser examinados neste artigo, são decisivos, porque tratam das intervenções que Pessoa faz na cultura para ampliar a concepção da poesia e, ao mesmo tempo, usá-la como uma forma de operar na interrogação e na resposta da filosofia. Participa assim de uma metamorfose profunda que ocorre no Ocidente nos séculos XIX e XX. Alimenta, portanto, com envergadura própria, a dinâmica que parte de Marx, Nietzsche e Freud, na geração de uma transformação histórica do paradigma da sensibilidade e do pensamento cultural. Poderíamos dizer que existe um evento Pessoa, uma ruptura singular na cultura do Ocidente.
Como pensá-la?

Pessoa: árvore de galho duplo

O primeiro aspecto é a formação de uma galáxia de poetas em torno da figura de Alberto Caieiro, “meu mestre”, dizem Pessoa, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. A grande novidade disso tudo é que Fernando Pessoa cria uma confraria de poetas, para arquitetar uma renovação da poesia. Faz a construção de personagens numa configuração poética que vai marcar o Ocidente: a produção de heterônimos. Só que essa produção de heterônimos não fica restrita à poesia, se estende para outros campos da cultura. Nessa trajetória, uma luxúria inventiva, vem Bernardo Soares, que, em prosa, escreve o “Livro do Desassossego”, vem o filósofo Antonio Mora e vem a voz estóica do Barão de Teive, além da produção do ortônimo Fernando Pessoa. Trata-se de uma ampla renovação da literatura, dotada de um modelo baseado no trabalho poético.

Cabe considerar que o núcleo do trabalho de Pessoa é, sem dúvida, a poesia. E focalizando mais de perto, discutir dois temas: o que significa a criação do que chamo ‘galáxia pessoana’, e qual a natureza da sua poesia, porque essa, por sua vez, tem dois aspectos, árvore de galho duplo. O primeiro revela a questão da própria poesia que Pessoa diz ser “dramática”, e o segundo, que se baseia na ideia de que ele faz uma poesia de inspiração filosófica — o que, na verdade, é também uma intervenção na filosofia. Por quê? Porque sua atitude é antifilosófica, já que se coloca fortemente contra uma filosofia sistemática. Nesse sentido, a estratégia de Pessoa entra na onda de uma renovação cultural contra um paradigma organizado ao redor da ideia de sistema e cujo operador seria a racionalidade. Todas as áreas do saber fazem parte desse sistema, que encadeia as partes em relação ao todo, como o todo em relação às partes, discriminando umas em relação às outras. Obviamente, a ciência primeira, a ciência magna seria a metafísica, de onde se desdobraria tudo. Ele, Fernando Pessoa, se inscreve num amplo movimento que produz a fragmentação desse todo como uma das marcas que vai definir a forma dos homens modernos apreenderem o mundo nos dias que correm. “Fragmentação, fragmentação, fragmentação” diz um verso de um poema.

Poesia dramática

1. A Galáxia Pessoana
Fernando Pessoa confronta seu trabalho com Shakespeare. Simplesmente porque é preciso discutir com a cultura vigente a criação que faz dos diversos poetas. Diante das múltiplas críticas às suas invenções, que parecem socialmente doidas, a de um poeta criar vários poetas e estar ele mesmo no meio deles, Fernando Pessoa, reivindica o fato de que ninguém coloca essa questão da invenção de múltiplos personagens em Shakespeare. O bardo não é Hamlet, não é King Lear, não é Lady Macbeth e nem tem o mesmo caráter de suas figuras dramáticas. Ou seja, a verdade bastante nítida é que a invenção de Lady Macbeth não faz de Shakesperare um criminoso. Então, por que Pessoa não poderia criar a multiplicidade de poetas, os seus heterônimos, e se incluir nela? Shakespeare e Pessoa são autores que inventam personagens para o palco e para a poesia. Por que não pode o autor, no caso Pessoa, se colocar como uma das máscaras da obra? Por que o Pessoa ortônimo está impedido de entrar na confraria dos poetas? Genialidade que levou o autor Phillip Roth colocar-se também como o personagem Phillip Roth num de seus romances.

"O núcleo do trabalho de Pessoa é, sem dúvida, a poesia". Mas o gênio de Pessoa faz isso mesmo, um projeto de criação poética, onde ele se inclui como figura dramática do círculo da poesia. Ou seja, ele é o criador e, ao mesmo tempo, um integrante da galáxia. Há, portanto, dois movimentos na concepção dessa última. Um que vem da criação da irmandade dos poetas, tendo como centro, como mestre, Caieiro, e como discípulos Ricardo Reis e Álvaro de Campos — e que termina por introduzir nesse grupo, o próprio Fernando Pessoa com os seus poemas. A confraria, a galáxia pessoana, reúne tanto os heterônimos como o ortônimo. Mas, nesse processo — e aqui está a grande diferença — há também, em Pessoa, um corte, uma distância dessa galáxia. Significa que ele se põe tanto como poeta da confraria, mas também como seu criador dramático. Num sentido, faz parte da galáxia, portanto é um criador de poemas como os outros, e também admira e chama Caieiro de seu mestre. Mas, noutro sentido, é o poeta dramático, o inventor de todos os poetas e inclusive o autor da sua inclusão na confraria deles. É aqui, na invenção de uma poesia dramática, que ele está no nível de Shakespeare. Pessoa concebe uma dramaturgia criando “poetas” personagens que fertilizam a cultura de Portugal. São inventados para serem imaginaria e simbolicamente integrantes do mundo da literatura. E, ao mesmo tempo, aparecem como máscaras, personas de Pessoa.

2. O mestre Caieiro
A pergunta decisiva é: por que Caieiro é o mestre? Nesse ponto é preciso dar uma alargada na questão da poesia dramática e trazer o tema para a poesia de inspiração filosófica. O que importa entender é que Pessoa recusa, como Marx, Nietzsche e Freud, um pensamento que tenha uma base sistemática. E Pessoa resolve colocar um torpedo na filosofia, entrar na lida de uma antifilosofia que tenta pôr em questão e em causa toda a filosofia ocidental, no mínimo desde Platão até Hegel. Só que não faz como Nietzsche e Heidegger, uma volta aos pré-socráticos. Produz uma volta à situação primeira do homem, a situação do “pasmo essencial” (Pessoa, p. 138) em face ao mundo. E isso é revelado em Caieiro, através desse contato do homem com esse mundo, colando o sujeito ao objeto. É preciso nuançar fortemente aqui. O sujeito e objeto existem em separação, num determinado desencontro. E esse desencontro, a meu ver, funda o caráter trágico da situação do homem no mundo. E essa distância entre o sujeito e o objeto é que levou a filosofia a toda uma revolução de rejeitar a poesia e tentar preencher essa brecha, através do enlace dos conceitos. A cultura se formou como metafísica a partir de Platão e Aristóteles e chega até Pessoa com algo que tenta ser uma totalidade conceitual fechada. A história avança para uma tentativa de recusar a sistematicidade filosófica e a recusa de Pessoa vem através de um formidável vôo cultural, que visa ultrapassar tudo o que foi produzido, romper com o que veio sendo construído. E colocar Caieiro no frescor de um momento original, na mesma posição daquele espanto do verdadeiro contato do homem com o mundo, na origem da história ocidental. É por isso que o mestre cola-se como sujeito ao objeto.
Para essa admiração originante da poesia e da filosofia, Caieiro usa a sensação — sobretudo visual, aquela que tem origem no olhar — para fazer uma emoção poética, uma emoção que descobre que o céu é céu, que a árvore é árvore, o sol é sol, a pedra é pedra. Ou seja, estamos no proto-estágio da filosofia. E daí vem a volta ao paganismo, porque é no paganismo que o homem vive a mais plena admiração do mundo.

Mas Pessoa, em certo sentido, sabe que a filosofia se constrói muito em cima de Platão. E ao buscar a ideia dos objetos no mundo das ideias, o que Platão faz é desqualificar o mundo que nós vivemos como um mundo da aparência. Pois o gesto de Caieiro é o oposto, é aquele de mergulhar no mundo das coisas, no mundo dos objetos. E, nesse sentido, obter uma emoção poética que valide o que está aí, a Natureza em face da qual ele vive. Logo, uma postura importante: Caieiro diz que pensar é estar doente dos olhos. Por quê? Caieiro acaba por nos dizer que, é claro, pensar as ideias platônicas é que é estar doente dos olhos. Exatamente porque não vejo o mundo, pois, no caso de Platão, o mundo só pode ser olhado se estou possuído das ideias inteligíveis que habitam o topos uranos, o céu das ideias. O que é estar cego para o mundo. Por essa razão, há uma forte reação de Caieiro contra essa filosofia. E tudo começa nele com o ver, com o olhar, com estar voltado sensivelmente para a Natureza, para as árvores, para as pedras, para o rio, para as flores, para os montes, para as folhas, etc. Ver, tocar, ouvir, aspirar e ter o sentido gustativo. Como diz Reis sobre Caieiro: “O Pã renasceu”.

Então, resumindo: Pessoa, por intermédio de Alberto Caieiro, tem dois movimentos: o primeiro, recusando a história da cultura para retomar a atitude primitiva do homem; o segundo, combatendo a origem da filosofia, Platão, que é uma recusa do mundo pré-socrático, um mundo que se expressa fora do encadeamento de conceitos, mas que se expressa metaforicamente a partir de sensações oriundas do mundo sensível. Porém, Caieiro tenta ir além. Pois enlaçando metáforas, os pré-socráticos, sobretudo Heráclito e Empédocles, ainda não estão em contato com o mundo original. É, na verdade, o que busca Caieiro. E por isso, Fernando Pessoa o coloca como o centro da galáxia pessoana, como de todos, o mestre. Porque Caieiro tem o seu “rebanho de ideias” que são originados da sensação dos objetos. E como há em Caieiro uma certa recusa do trágico, a sua tentativa é fundir-se com o próprio mundo, colar o sujeito ao objeto, o homem ao mundo e dizer sem corte conceitual este mundo. Ter as ideias sensações. Ou seja, as ideias são as próprias sensações, só que expressas em forma de linguagem, como ideias abstratas. O que nada tem a ver com as ideias inteligíveis de Platão.

A galáxia, então, tem um centro, o mestre Caieiro, que se joga na recuperação das sensações, oriundas dos sentidos. Por isso que diz “Eu não tenho filosofias, tenho sentidos…” (Pessoa, p. 139). Os demais se organizam em torno desse poeta-mestre. Por exemplo, Ricardo Reis é um poeta onde a separação sujeito e objeto é uma dissonância sempre potencialmente rascante. A separação e o trágico se fazem presentes e Ricardo tem o sentimento de um desequilíbrio muito forte da relação homem mundo. Essa cisão é resolvida com o recurso de duas inspirações. Uma epicurista — ele é um epicurista triste — quando o eu poético, por exemplo, lembra aos seus amores, sobretudo Lydia, o reiterar de que a agitação da vida é perturbante, e que a melhor atitude é “colher flores” e não fazer esforços demasiados. E a outra inspiração tem que ver com uma atitude estóica, devemos renunciar a fazer face ao dinamismo agreste das coisas. “Cumpramos o que somos/ Nada mais nos é dado.” (PESSOA, p. 229)

A Antifilosofia

"O essencial é o saber ver"

“Sou um guardador de rebanhos./ O rebanho é os meus pensamentos/ E os meus pensamentos são todos sensações./ Penso com os olhos e com os ouvidos/ E com as mãos e os pés/ E com o nariz e a boca.” (Pessoa, p. 146) estabelece para os seus discípulos Ricardo Reis, Álvaro de Campos e o ortônimo Fernando Pessoa, o ponto de partida de qualquer desenvolvimento da poesia. Só que esse princípio é também um ponto de partida para a filosofia. Porque é preciso fazer uma recusa da filosofia ocidental. E a forma de fazer isso é recusar a ideia de que o pensar se reduz às demonstrações sistemáticas da filosofia grega clássica, do cristianismo tomista e todas as variantes da filosofia católica e da filosofia cartesiana até Kant e Hegel. Ou seja, o que se busca é o estabelecimento de uma verdade que seja caucionado por uma atitude primeira diante do mundo. Antes do desenvolvimento de um tratado e, ao mesmo tempo, mantendo-se nessa atitude original. Sob certa forma, Freud faz igual, se detém diante de uma integração da psicanálise a qualquer sistematicidade filosófica. Assim, Caieiro alcança o ato original do pasmo essencial e procura sustentar-se na frequência do “paganismo” das sensações. É preciso estar sempre com essa atitude de maravilhamento em face do que Caieiro chama “a eterna novidade do mundo”.

Mas porque a Natureza e, por extensão, a História, é dinâmica, que a influência de Caieiro culmina na posição contemporânea de Álvaro de Campos. Esse, parte do mestre, mas segue um outro caminho, avança no mundo, na eterna novidade de uma realidade diferente, “a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos”. (Pessoa, p. 240). A gente pode perceber que Álvaro de Campos na “Ode Triunfal” toma uma atitude em face dos objetos atuais, aqueles que surgem no universo das fábricas. Um pouco como Chaplin nos “Tempos Modernos”. Assim, nessa Ode, o que Campos ativa é o cantar longamente da presença dessa hora. “Em febre e olhando os motores como uma Natureza Tropical –/ Grandes trópicos humanos de ferro e fogo e o futuro,/ Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro, / Porque o presente é todo o passado e todo o futuro./ E há Platão e Virgílio dentro das máquinas e das luzes elétricas/ Só porque houvera outrora e foram humanos Virgílio e Platão.” (Pessoa, p. 240). Ou seja, Álvaro de Campos se situa em face de um mundo diferente do mundo antigo, tentando compreender essa brutal e nova realidade, mas com a atitude de pasmo essencial originada na posição de Caieiro e estendendo para a eternidade (presente, passado, futuro).

A postura de Álvaro de Campos vai estabelecendo um tema que Alain Badiou, na sua intervenção do Colóquio de Cerisy de 1997, diz de forma aguda: os filósofos têm que ser contemporâneos de Pessoa. Pois é preciso tratar filosoficamente tanto “do Binômio de Newton como da Vênus de Milo”. (Colloque, p. 150). Ou seja, nem ficarmos na definição da realidade pela ciência, nem nos plantarmos no isolamento e na liberdade absoluta da arte. O que interessa para Alain Badiou, na sua proposição de uma filosofia viva e atual, é a dialética do Binômio de Newton e da Vênus de Milo. Fernando Pessoa, através da criação de sua galáxia de poetas e de seus heterônimos, influencia profundamente a visão filosófica de Alain Badiou. Só que numa direção, ao mesmo tempo, dentro da posição de Pessoa e, ao mesmo tempo, fora. O pasmo essencial sim, é um pasmo a Álvaro de Campos, mas a solução de Badiou passa por um retomar a filosofia a la Platão, basta ver o emprego que faz da matemática em “L´Être et l´Èvénement” (“O ser e o acontecimento”). Uma espécie de re-captura da antifilosofia pela filosofia. O que diria Fernando Pessoa diante desse imenso elogio imerso na recaída de um retorno platonizante? Botaria o poeta personagem Caieiro a falar poeticamente: “O essencial é o saber ver,/ Saber ver sem estar a pensar”. (Pessoa, p. 151)

Estão desenvolvidas neste artigo duas ideias que apresentei no seminário coordenado por Lucia Serrano Pereira “A ficção na psicanálise: Freud, Lacan e os escritores”, na ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE – APPOA, encontro que tinha como objetivo examinar a obra de Fernando Pessoa.

Citações:
– Colloque de Cerisy — Pessoa. Unité, Diversité, Obliquité. Christian Bourgeois Éditeur, 2000, Paris.
– PESSOA, Fernando – Obra poética. Editora Nova Aguilar, 1986, Rio.

*Formado em Filosofia, crítico de cinema, psicanalista e economista.

Fonte: jornal sul21

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Documentário poético sobre Caio

 “Sobre sete ondas verdes espumantes”, dirigido por Bruno Polidoro e Cacá Nazario, é um longa-metragem sobre a vida e a obra de Caio Fernando Abreu. As filmagens aconteceram em vários países europeus, mas também entre familiares de Caio, que são os principais avalistas do filme. Dia 10 de junho, foram rodadas as últimas imagens do filme.

Segundo Polidoro, o roteiro é poético porque se debruçou sobre os textos de Caio, e não exatamente sobre a vida dele. “Selecionamos trechos que dividimos nas sete ondas do título, os sentimentos que consideramos mais intrínsecos na obra de Caio. São sete partes que se misturam porque sentimentos também não existem sozinhos”, explica.

Amsterdam, Berlim, Paris e Londres são algumas das cidades que a equipe deve percorrer: locais onde Caio viveu e descreveu nas páginas de seus livros. A viagem também servirá para entrevistas com pessoas como o editor alemão Gerd Hilger, com quem Caio manteve extensa correspondência, o tradutor italiano Bruno Persico e o diretor Patrick Deville.


Sobre sete ondas verdes espumantes from Besouro Filmes on Vimeo.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

LUZ Clássica

Cinema é luz e sombra. A luz, e sua antítese, a sombra, fecundado no inconsciente coletivo toda uma sorte de vivências ancestrais que vem repercutindo no imaginário social ao longo da existência humana sobretudo através das artes plásticas e do cinema. Aula passada tivemos uma prática da construção da imagem, partindo do modelo clássico de iluminação. Eis alguns resultados, deste experimento.


















terça-feira, 7 de junho de 2011

LUGARES Estranhos e Quietos

Aula passada vimos a construção da luz na pintura e influências no cinema. Chamou-me a atenção Edward Hopper porque tenho um livro com a reprodução de um dos quadros deles na capa. Curiosamente, 'Histórias de Amor', de Bioy Casares.

Bruno Polidoro citou a influência de Hopper no trabalho de Wim Wenders. Lugares Estranhos e Quietos é uma mostra fotográfica do diretor. Ela esteve em São Paulo e reuniu 23 fotos realizadas ao redor do mundo, de lugares peculiares, como diz o título, em sua maioria fotografados sem a presença de pessoas.

Contudo, em termos de composição, luz, enquadramento, certamente Hopper namorava no cinema. Embora seus quadros mais conhecidos são os que fazem referência ao noir americano, o tempo não é acelerado.  As 'cenas' de Hopper retratam grandes espaços vazios. Mais narrativo e contemplativo, pode-se achar Hopper em Antonioni e vice-versa. Sendo Wenders um admirador de Antonioni, percebemos aí, uma linhagem artística. Três gerações sensíveis à solidão urbana, à incomunicabilidade e aos enquadramentos geométricos.

 Wenders











Hopper 











Antonioni

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Bruno Polidoro e A Importância de Pensar o OLHAR

por Sonia Montaño*

Entre a cinematografia gaúcha produzida em 2010, um curta chamou a atenção da crítica nacional e internacional. Trata-se do filme Peixe Vermelho, produção independente dirigida por Andreia Vigo, com direção de fotografia de Bruno Polidoro.

O filme tem como referência o cineasta norte-americano David Lynch que esteve em Porto Alegre por ocasião de sua conferência no Fronteiras do Pensamento, em agosto de 2008. Além da obra estar atravessada pela estética surrealista de Lynch, ele próprio tem um protagonismo ambíguo no filme, fazendo mais de um personagem. A obra ganhou 4 prêmios no 38º Festival de Cinema de Gramado: Melhor Produtor/Produção Executiva, Melhor Fotografia, Melhor Edição de Som e Melhor Música e ganhou o prêmio Especial do Júri no 2º Annual Lady Filmmakers Film Festival em Los Angeles. Recentemente, o filme ganhou Menção Honrosa no 17º Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá.

Formado em realização Audiovisual, Bruno Polidoro fez Mestrado em Comunicação na Unisinos, na Linha Mídias e Processos Audiovisuais, com a dissertação “Sobre a Luz e as potências do escuro na fotografia. Imagens técnicas de alcova no cinema”. Segue breve entrevista de Sonia Montaño com ele sobre o sucesso do curta, amadurecimento pessoal e profissional.

Como foi a experiência de ser tão premiado pelo teu trabalho em Peixe Vermelho?

Acredito que o Peixe Vermelho seja um filme não muito usual em nossa cinematografia local. Ele brinca com a desconstrução narrativa, e a produção de imagens sensoriais mais do que descritivas. Assim, construímos um filme de grande liberdade criadora, mas com um trabalho técnico rígido, com amplos estudos e pré-produção. As imagens pulsam, ofuscam e instigam os olhos. Os prêmios, dessa forma, são conseqüências desses efeitos que, felizmente, parecem estar atingindo uma parte do público.

Qual é o principal mérito da obra?

O mais deu certo no filme foi essa conjunção entre liberdade criadora e planejamento na realização. Durante as reuniões conceituais, o roteiro era extrapolado, gerando novas situações, personagens e locações. A partir do momento em que se começou a realizar a obra, passamos a seguir os estudos realizados anteriormente, gravando o filme de maneira sistemática. Essa organização permitiu, ainda, um sopro de intuições no momento da gravação, fazendo com que algumas coisas fossem mudadas na estrutura, a partir do afeto com os personagens, meio e equipe.

Em que sentido a experiência do mestrado e tua participação no Grupo de pesquisa em Audiovisualidades (GPAv) contribuiu para crescer profissionalmente?

Essa pergunta me faço seguidamente. Depois de muita reflexão, acho que posso apontar o que mais me toca quando penso sobre isso. Tecnicamente o mestrado não contribui diretamente para o meu trabalho como Diretor de Fotografia, pois não me trouxe novos domínios de câmera, refletores e coisas assim, com as quais tenho de lidar quase todo dia. No entanto, é imensurável a amplitude de conceitos e ideias gerados pelo mestrado, que me permitiram mudar e questionar a todo o momento o meu olhar. Uma imagem vista nunca mais foi tratada da mesma forma por mim, depois de dois anos debruçado sobre as imagens das minhas alcovas. Assim, também, nunca mais consegui produzir uma imagem de maneira solta, sem um forte olhar crítico sobre ela. Crítico tanto estético, como social, pensando em Flusser.

Assim, com uma densidade conceitual sobre a imagem muito maior do que a que eu tinha antes do Grupo de Pesquisa Audiovisual, consegui me “soltar” mais em meu trabalho. Comecei a arriscar mais, pois tinha capacidade conceitual para defender as propostas talvez “menos clássicas”. E isso se refletiu diretamente na técnica, fazendo com que eu criasse imagens mais livres, com mais pretos, sem medo dos claros extremos. E, se tivesse de responder em uma frase só, eu diria que a maior contribuição para meu trabalho como Diretor de fotografia foi a da compreensão da potência do escuro como sombra. Ah, a sombra, o medo mais corriqueiro dos fotógrafos com seus corpos encarcerados pelos ambientes e refletores.

Além de Peixe Vermelho, Bruno Polidoro foi diretor de fotografia dos filmes: Um animal menor dirigido por Marcos Contreras e Pedro Harres,  recebeu o Prêmio júri oficial de melhor fotografia no FAM 2010 (Festival Audiovisual Mercosul), o prêmio de melhor fotografia na Mostra Gaúcha do Festival de Gramado 2010 e o prêmio de melhor fotografia no Festival dos Sertões 2010. O sabiá dirigido por Zeca Brito, para Histórias Curtas, da RBSTV, que levou a Melhor Fotografia no Prêmio Histórias Curtas 2010.  Enciclopédia, dirigido por Bruno Barreto que levou o prêmio de melhor fotografia no 33º Festival de Guarnicê.

*Entrevista publicada no site do Grupo de Pesquisa em Audiovisualidades e Tecnocultura
em December 29, 2010


BRUNO Polidoro é o ministrante da oficina FOTOgrafia, do Ciclo OLHARes Sobre o CINEMA, que inicia sábado, 4 de junho de 2011. Quer saber mais? acesse www.curtaocircuito.art.br

quarta-feira, 18 de maio de 2011

The Spine

In this animated short, Oscar® winner Chris Landreth returns with a poignant story of redemption that takes us into the relationship between a man and a woman trapped in a spiral of mutual destruction after 26 years of marriage. The Spine continues Landreth's pursuit of a twisted, beautiful and highly original visual aesthetic, using digital imagery to create characters whose physical appearances are metaphors for their unique souls.


terça-feira, 17 de maio de 2011

Linguagem satírica adorável

Jean Renoir foi um grande diretor francês que tratava, através de seus filmes, temas humanos, analisando o comportamento em histórias que prezavam sobretudo a qualidade dos diálogos. A Grande Ilusão, de 1937, foi assim. A Regra do Jogo, de 1939, funciona da mesma forma.

O filme A Regra do Jogo teve uma recepção muito ruim à época de seu lançamento. Apesar de ser  uma comédia sobre o comportamento da classe alta na época que antecedera a Segunda Guerra Mundial, seus conflitos amorosos, com excesso de libertinagem sexual, e algumas das questões morais apresentadas pelo roteiro (que foi escrito, em parte, pelo próprio Renoir) talvez estivessem à frente de seu tempo.

A Regra do Jogo demonstra como a futilidade e alguns problemas humanos não são específicos de uma classe social apenas. O roteiro é feliz ao retratar algumas situações e decisões errôneas entre os ricos e os pobres da mesma forma, mas não deixa de ser perspicaz ao mostrar que a maior das diferenças é que os ricos sofrem e erram com classe e elegância (vide a ótima cena final) – o que não deixa de ser uma síntese da sátira presente em todo o filme. A cena da caça, que ocupa um grande tempo de celulose, é uma demonstração perfeita da ignorância criticada acidamente por Renoir.

O filme possui muitos personagens, o que origina um grande número de situações diversas e, consequentemente, recortadas, picotadas em partes, às vezes ficando incompletas. O excesso dessas situações e de outras intrigas, porém, não atrapalha o desenvolvimento dos personagens.

A cena de caça de Assassinato em Gosford Park, de Robert Altman, é uma homenagem direta à toda a sequência de caça de A Regra do Jogo. Altman foi fortemente influenciado pelo filme de Renoir, principalmente pelo seu tom satírico, demonstrando um pouco da importância do filme para o cinema.  

 

terça-feira, 26 de abril de 2011

MOSTRA FESTIPOA LITERÁRIA - CINEMA, LITERATURA E HUMOR GRÁFICO

























quarta-feira, 20 de abril de 2011

É POSSÍVEL A ARTE MUDAR O MUNDO?

'Poesia', filme sul-coreano de Lee Chang-dong

É possível ensinar a escrever poesia? Aparentemente, sim. Num centro cultural numa cidade da Coréia do Sul, um grupo de pessoas senta-se em mesinhas escolares. Seus olhares são ávidos como de crianças no primário à espera de aprender as primeiras letras do alfabeto.

O professor, um poeta conceituado, mostra-lhes uma maçã e pergunta se alguém já viu a fruta. Claro, todos já viram, como ele mesmo diz, milhares de maçãs em suas vidas. "Vocês nunca viram uma maçã de verdade", decreta. Mas qual a diferença entre ver e enxergar?

Ao centro do drama sul-coreano "Poesia" está exatamente essa questão: o que vemos e o que enxergamos?  Mija (Jeong-hie Yun) é uma senhora que cuida do neto, e trabalha como faxineira e uma espécie de enfermeira de um homem que sofreu um derrame (Hira Kim). Ela é a última a se matricular na aula de poesia, e a aluna mais esforçada. Em seu caderninho, faz anotações quando frases e observações lhe ocorrem – não importa onde esteja.

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Luiz Carlos Merten *

Lee Chang-dong considera que foi decisivo o ano em que foi ministro da Cultura da Coreia. Ele não apenas se confrontou com a diversidade da produção cultural de seu país, como teve de atender a demandas, polemizar sobre o que estava sendo feito. Quando voltou à direção, sentiu-se inseguro como nunca na vida. Com medo de errar a mão, fez o filme mais simples que podia, e escreveu um roteiro tão detalhado que mais parecia um romance.  Secret Sunshine era sobre uma mulher que perdia o marido e, depois, o filho e buscava apoio na religião para a sua dor imensa. Chang-dong ganhou o prêmio de roteiro em Cannes, em 2010, pelo belíssimo Poetry (Poesia).

Outra mulher - uma avó - vela pelo neto suspeito de violar garotas. Ela sofre do Mal de Alzheimer e busca nas palavras, na poesia, uma forma de retardar o esquecimento, driblando sua morte em vida. Chang-dong encontrou-se com a reportagem do Estado no Festival de Cannes. Estava feliz com a recepção a seu filme - a entrevista foi feita antes da premiação. Por Secret Sunshine, ele já havia sido premiado em Cannes - melhor atriz. Se houvesse novo prêmio para ele, Chang-dong esperava que fosse de novo o de interpretação feminina.

Yoon Hee-jeong, que faz a avó de Poetry, tem mais de 300 filmes no currículo. É uma estrela vem seu país, mas há 15 anos ela não filmava. O que Chang-dong fez para convencê-la a voltar ao cinema? "Escrevi Poetry especialmente para ela, que ficou lisonjeada. Quando leu o roteiro, ficou fascinada, não apenas pela personagem, mas também pela precisão da escrita. Tudo estava ali previsto e detalhado. Gosto de fazer assim. É a forma como me sinto livre para mudar tudo no set. Mas as coisas não foram simples para Yoon. Quando ela filmava muito, a sincronização era diferente, feita na maioria das vezes a posteriori, em estúdio. Foi preciso que ela se adaptasse a um novo estilo de filmagem. Mas Yoon não é uma estrela. É muito humana, e foi um prazer para toda a equipe tê-la no set. Virou uma espécie de avó da equipe, preocupada com todos e com cada um."

Reflexões. A entrevista é feita com tradutor. Cada pergunta demora um tempão para ser formulada. As respostas demoram mais ainda. Chang-dong é reflexivo, olha nos olhos do entrevistador. Secret Sunshine olhava o mundo do ângulo das vítimas, Poetry talvez se construa do ângulo dos familiares dos carrascos. Ele diz que não pensou assim. "O que m e atrai é o ser humano. Carrascos ou vítimas, nós nunca somos só uma coisa. A natureza humana é complexa e, como artista, tenho a impressão de que minha função é iluminá-la. Filme para conhecer o outro e a mim mesmo."

O tema da doença é essencial em Poetry. O Mal de Alzheimer tem aparecido com frequência no cinema. O repórter insiste na definição de ‘morte em vida’. Chang-dong diz que a ligação da personagem com as palavras - poesia - faz parte de um movimento íntimo. "Dando novo sentido às palavras, ela busca preservá-las, e o que representam, do esquecimento." É filme belo e contemplativo. Serve à poesia e ao cinema. À poesia do cinema?

*Crítico de cinema.

terça-feira, 19 de abril de 2011

UM OLHAR A CADA DIA

por Adriano de Oliveira Pinto*

O homem evolui no período que separa os dois extremos de um mesmo século? Se a sua resposta é "sim", saiba que Theodoros Angelopoulos  pode achar nem óbvia, nem absoluta, tal asserção. Neste filme, o diretor heleno mostra, à sua moda, que a pureza da alma humana está ficando para trás e que a barbárie, se não cresce, muito menos se extingue ao longo do tempo.

A odisseia de um Ulisses moderno é recontada livremente por um Angelopoulos-Homero que, por meio de um protagonista sem nome - um cineasta grego (o americano Harvey Keitel) de volta à sua região natal -, apresenta seu desencanto na humanidade. O tempo da história narrada é o da época de sua realização, primeira metade da década de 1990, com a Guerra da Bósnia em andamento e lhe servindo parcialmente de cenário. O herói faz sua jornada pelos Bálcãs em busca de três rolos de filme não-revelados dos irmãos Manakis, pioneiros da fotografia e do registro cinematográfico cotidiano em terras argivas e nações arredores. Singrando ele não por águas marítimas jônicas, mas por territórios balcânicos em momento hostil, efetiva uma busca que vai além do objetivo material. Os rolos históricos dos Manakis são somente o McGuffin de uma viagem mais que meramente física, sobretudo lírica.

A procura pelos registros iniciais do século 20 em forma de filmes documentados por pioneiros transcende o mundo palpável. O que o personagem central quer é captar a essência do olhar do começo daqueles anos - uma visão de mundo certamente bem mais pura que a do final do mesmo período. Depois desses tempos de paz assinalados em fotogramas pelos irmãos documentaristas, a região enfrentou conflitos tempestuosos: as guerras Balcânica, Primeira e Segunda Mundiais e bem mais adiante, a da Bósnia. Em força disso, a inocência desaparecida se transforma no pote do final do arco-íris: um tesouro inalcançável. A entropia causada pelas ambição e "evolução" humanas irreversivelmente leva embora uma percepção mais doce, pacífica e pastoral do mundo, deixando no lugar desta uma malquerença crescente. A origem desse mal, na visão dos roteiristas (entre os quais o diretor e também o lendário Tonino Guerra, escritor das obras de Antonioni) está na política, no nacionalismo ufanista e na intolerância étnica que assolaram a região. Curiosa e paradoxalmente, o herói vai buscar paz espiritual numa região de conflito armado corrente.

Angelopoulos, com seu cinema contemplativo e de reflexão, define-se bem quanto ao seu modo de filmar. Fazendo uso de uma câmera fluida, por entre travellings, zooms e gruas, ele leva a cabo uma lenta (e necessária, dentro de seus propósitos) narrativa convencional pontuada de planos-sequência engenhosos. Um destaque àquele que introduz em cena o personagem de Keitel, esse Ulisses moderno do filme. Rodado à noite, com passagens variadas de locações e bom número de figurantes, assombra pela perfeição de sua execução e rara beleza. É talvez um dos mais espetaculares que o Cinema testemunhou. Cenas como as duas consecutivas que focalizam refugiados albaneses - ora estáticos (lembrando uma inesquecível cena de O Ano Passado em Marienbad de Resnais), ora em movimento a diferentes tempos -, aquela da jornada da estátua de Lenin (com sua colossal cabeça como a observar a derrocada de seu regime político) e outra que realiza uma variação sobre O Baile de Ettore Scola já carregariam intrinsecamente, cada qual delas, enorme significado dentro dos respectivos contextos apresentados. Mas Angelopoulos não se contenta apenas com isso: reveste essas mesmas passagens com uma poesia visual de tirar o fôlego.

Há tanto apuro imagético, principalmente na primeira metade do filme, que o roteiro parece se tornar secundário. Primeira impressão, pois forma e conteúdo aqui caminham de mãos dadas, infrequente cônjuge. Theo conhece igualmente o poder da sugestão, e exemplo disso é o uso de um conjunto mais-que-perfeito de contextura, imagem e som para realizar tal efeito, o que se dá na trágica cena da neblina em Sarajevo, quando o espectador é arremessado ao drama então vivenciado pelo protagonista, o qual tem de imaginar a ação onde não a pode ver.

Com uma fotografia esplêndida obtida mormente sob céus plúmbeos, trilha sonora gentil, atuações comoventes de Keitel e Maia Morgenstern (esta a representar todas as mulheres parceiras na tristeza do Novo Ulisses) e tantos outros predicados, esta obra de quase três horas de duração se afirma como uma das peças fundamentais do final do século passado, aquele conturbado período abraçado por quem retratou a procura por um olhar perdido, definitivamente perdido: um olhar tragado pelo caos.

Um Olhar a Cada Dia (To Vlemma tou Odyssea)
Direção: Theodoros Angelopoulos
Roteiro: Theodoros Angelopoulos e Tonino Guerra
Com: Harvey Keitel, Maia Morgenstern, Erland Josephson, Yorgos Michalakopoulos
País de produção: Grécia/França/Itália/República Federal da Iugoslávia/Reino Unido/Bósnia-Herzegovina/Albânia/Romênia/Alemanha
Ano de lançamento: 1995
Disponível em DVD no Brasil
Duração: 176 minutos

*originalmente publicado no site da Accirs.

segunda-feira, 21 de março de 2011

OLHARES Sobre o Roteiro

Um bom roteiro não se resume apenas a ter uma boa idéia ou a colocá-la no papel. Ao longo desse processo, o que conta não é somente a capacidade de escrever, mas também de perceber o tipo de história que se quer contar.

Para a oficina que inicia sábado, dia 2 de abril, Vicente Moreno pretende explorar e aprofundar os fundamentos do roteiro cinematográfico, buscando uma maior compreensão sobre sua escritura e possibilidades de estrutura. Conflito, ação, personagem, temporalidade, focalização são apenas alguns dos elementos que serão abordados em aula. Mas a máxima do curso, segundo Vicente, é a formação do olhar através do acesso a diferentes aspectos do pensar e fazer cinema.

Vicente Moreno tem formação em Realização Audiovisual pela Unisinos, onde é professor do módulo de montagem e roteiro no curso de Especialização em Cinema. Atua no mercado audiovisual desde 2006 como roteirista, montador e diretor, realizando programas para televisão, curtas, médias e longas-metragens. É diretor dos curtas-metragens "Sem Sinal" (vencedor do prêmio Histórias Curtas 2009) e "Mãos Dadas”, ambos premiados com melhor direção. Entre os longas-metragens, os mais conhecidos são “Ainda Orangotangos” (2007), como assistente de direção; “A Última Estrada Para Praia” (2010), como co-roteirista e assistente de direção; e "ABSOLUTO - Internacional Bicampeão da América", como diretor.

Vicente Moreno é autor do texto 'O Olho Que Tudo Vê', publicado no blog.

CINEMA EXPERIMENTAL

“Viver efetivamente é viver com a informação adequada”, já dizia Norbert Wiener. Na era da tecnologia da informação, onde somos orientados a armazenar o máximo possível de dados, ao invés de vivenciá-los, refletir e construir conhecimentos, a arte experimental pode ser vista como uma resistência favorável para a ação do agir para mudar.

Mais fácil de elucidar isso, é retroceder o olhar sobre, por exemplo, a vanguarda russa cinematográfica da década de 20, quando Eisenstein e Vertov produziam audaciosos experimentos fílmicos. Sem suas descobertas, o cinema tal como conhecemos hoje, não existiria. E, sobre esse ponto de partida, cabe um olhar pausado sobre o que chamamos de cinema normal e experimental, ou de vanguarda, nos dias de hoje. Se este é o que contribuiu para a existência do outro, porque nos parece mais palpável o normal ao experimental?

Anos de dominação política, econômica e publicitária explicam bem isso. A transformação da arte em produto de consumo em grande escala, ou a negação do valor da arte como produto autônomo, é uma via perigosa de mão dupla, cativa do pensamento conservador que soterra a contribuição, ou mesmo a existência das vanguardas, sobre o efeito visual do ‘novo’ modelo, onde não há modelo, pois tudo é arte. Soltas as cordas de sustentação da ponte, a travessia torna-se flutuante. Ou, sob o novo aspecto, desnecessária. Para que refletir, se tudo é arte?

No entanto, o mesmo pensamento que projeta o esvaziamento do fazer pensar, tem necessidade de controle, de enquadrar, nomear, denominar. Assim, é comum e cômodo identificar o objeto pela negação, em contraposição ao já estabelecido, ao tradicional, ao clássico. A arte perde sua autonomia e passa a existir pelo que ela não é.

Nada contra a negação, pois ela é o primeiro sintona de interação, de que algo foi sensibilizado. Saber o que é, será o próximo passo. Contudo, se vazia de conteúdo, a inquietação pode ser apenas indigesta. Nada que um sorrisal não cure e faça esquecer, tais quais as Bienais brasileiras.

A tecnologia anda mais rápido que o conteúdo, que é raso, repetitivo e não conversa com o cotidiano do telespectador. Este foi um dos comentários de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho (o Boni), um dos pais da televisão brasileira, em entrevista à Marilha Gabriela, no programa Roda Viva.     

Refletir é tão essencial para a sobrevivência da espécie humana que apenas a má-fé ou a alienação podem pretender ignorar. É preciso urgente recuperar a capacidade de questionar e dar vazão as inquietações. E, nesse aspecto, a arte de vanguarda é prodigiosa em sua história, feita por artistas que tem a coragem de alargar a experiência humana. Suas obras são convites à resistência e à celebração.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Arthur de Faria viene a la Argentina para Músicas del Sur II

El sorprendente músico brasileño Arthur de Faria llega a la Argentina para presentarse en el marco del ciclo Miradas al Sur II, que reúne entre el 10 y el 20 de marzo en Buenos Aires a una muy interesante camada de músicos argentinos, brasileños y uruguayos.

Organizado por el Centro Cultural San Martín, el ciclo se desarrollará a lo largo de diez jornadas, con shows todos los días con entrada libre y gratuita en el Teatro 25 de Mayo (Triunvirato 4444) con un programación que incluye, entre otros, a los argentinos Rudi y Niní Flores, El Arranque, Dolores Solá y el quinteto de Diego Schissi; los uruguayos Martín Buscaglia, Leo Maslíah y Samantha Navarro y los brasileños Na Ozzetti, Marcela Pretto y Cida Moreira.

El encuentro, realizado por segundo año consecutivo, es un intento por trazar algunas coordenadas musicales sobre un conjunto de intérpretes y creadores pertenecientes a un universo cultural y geográfico común y al mismo tiempo diverso, en el que se marcan tanto afinidades como distancias.

Nacido en Porto Alegre hace 42 años, De Faria es productor, arreglador, compositor e intérprete y sostiene al mismo tiempo diversos proyectos musicales, tanto bajo formas camarístico-orquestales con base de rock, como musicalizando obras teatrales, programas televisivos o películas o haciendo arreglos para orquestas de cuerdas, además de hallarse abocado a la reconstrucción de 250 años de música en Porto Alegre.

Refiriéndose a este encuentro musical y hablando sobre las particularidades de Porto Alegre en relación con el resto del Brasil, De Faría señala que a diferencia de su ciudad "Brasil siempre estuvo de espaldas a América Latina" en términos culturales y musicales.

"En Rio Grando do Sul y en Porto Alegre es distinto, porque nosotros quedamos ubicados entre San Pablo y Buenos Aires y tenemos una cercanía cultural muy fuerte con Argentina y Uruguay, pero esta es una mirada que no es común con el resto del Brasil", dice De Faria en charla con Télam antes de llegar al país.

Para situarlo en términos concretos, De Faria dice: "Mi abuelo siempre escuchó tango, al igual que toda la gente de Porto Alegre y Borges fue el escritor que más leí; por estas cuestiones culturales, quizás me siento más en casa en Buenos Aires que en Rio de Janeiro o San Salvador y también por esto mis amigos de Sao Paulo me llaman medioargentino".

"Para los del Sur -señala- las fronteras son artificiales, el chamamé es una música que se toca mucho en Rio Grande, es una patria común, así como la milonga o las músicas folclóricas, para nosotros empieza a solidificarse esa cultura común del Plata."

 "Si hubiera que pensar estas cuestiones en términos de secesión, creo que Porto Alegre, Uruguay y Argentina podríamos fundar los Estados Libres del Plata, con capital en Montevideo", dice De Faria riéndose y jugando con la historia para graficar una afinidad cultural que se extiende hasta el sur del Brasil.

De hecho el pianista y compositor gaúcho con su banda musical (Arthur de Faria e Seu Conjunto) acaba de editar "Música para escuchar sentado", un disco armado sobre la base del tango y que en extrañas mezclas de logradísimos sentidos, une la milonga, el bolero, la marchina, la salsa, el chamamé, el funk, el rock y el punk.

De Faria, que se declara fanático de Astor Piazzolla, al punto de tener 66 discos de él y de haber leído todas sus biografías, dice que "está claro que no se puede hacer nada en el tango partiendo de Astor, como no se puede hacer nada en la música brasileña partiendo de Jobim".

"Hay que buscar -aclara- desde donde ellos empezaron, pesquisar qué sonoridades buscaban ellos, intentar partir de ahí para empezar a desarrollar y no partir desde ellos porque desde allí nos hay destino a no ser una mala copia de lo que ellos crearon que es una falsa ilusión de novedad".

De Faria agrega: "yo soy un tipo nacido en la ciudad, nunca voy a hacer una milonga como si fuera un tipo tierra adentro o un tango como un porteño pero el tango es parte de mi identidad cultural así como otras cosas con las que yo lo mixturo".

Para presentarse en Buenos Aires (actúa el sábado 12 a las 21), De Faria llega en formato de Dúo, junto al baterista y pianista Fernando Pezao, con quien conforma el Duo Deno.

"En este proyecto, y ese es su sentido, toco todo lo contrario a lo que hago con mi orquesta; con Fernando somos como una pequeña orquestita de circo que se fue quedando con pocos músicos y poca plata y donde tenemos que arreglarnos y hacer la sonoridad con las pocas cxosas que tenemos: yo con el piano, el acordeón y algunos juguetes, y Fernando con percusión, piano y piano de juguete", cuenta.

"Es una propuesta que tiene mucho de teatral y que se mueve bajo la premisa de intentar hacer lo más que se puede con lo mínimo", afirma.

Con esta formación, De Faria y Pezao van a tocar un repertorio con muchas recreaciones de canciones de Lou Reed, Fito Páez, Los Beatles, entre otros.

Imagens extraidas das redes sociais inspiram Flavya Mutran

“Pretérito Imperfeito de Territórios Móveis” é a exposição de Flavya Mutran que traz imagens de retratos fotográficos extraídos do universo dos álbuns de redes sociais e abre no dia 19 de março (sábado), das 11h às 13h, na Galeria Xico Stockinger da Casa de Cultura Mario Quintana (Andradas, 736, 6º andar). A visitação segue até 17 de abril, de terças a sextas-feiras, das 9h às 21h e sábados e domingos, das 12h às 21h. O lançamento do catálogo será realizado  no dia 16 de abril, das 11h às 13h, com a presença da artista.

Flavya Mutran busca diferentes maneiras de explorar fotograficamente o rosto, por meio da experimentação poética de retratos virtuais extraídos da Internet. “Os rostos que se apresentam nesse ambiente são móveis e multifacetados, são fragmentos visuais de territórios móveis, de passado incerto, presente inconcluso e de futuro fragmentado em pixels”, afirma. Natural de Belém do Pará, a artista conclui mestrado no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do Instituto de Artes Visuais da UFGRS. Seu trabalho ganhou o XI Prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia em 2010. Mais sobre Flavya http://flavyamutran.wordpress.com/

quarta-feira, 9 de março de 2011

All you need are eyes

Hyde Tube é um banco de dados internacional que permite ver centenas de filmes curtos feitos para comerciais, vídeoclip e animação. Em 2009, eles organizaram seu primeiro festival.

Assista a abertura dedicada ao jurí.


The Hyde Tube Festival from Etapes on Vimeo.
More about: http://www.thehydetube.com/

terça-feira, 8 de março de 2011

Horas de Verão, de Olivier Assayas

 Isabel Ferlini

O filme “Horas de Verão”, de Olivier Assayas, sucesso na programação da 32ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, chega às locadoras de Porto Alegre.

Escrito e dirigido por Olivier Assayas, "Horas de Verão" questiona o valor da herança material e emocional, para as gerações seguintes. Com a morte da mãe, três irmãos vêem-se envolvidos com a herança de uma coleção excepcional de arte do século XIX, preservada  na casa de campo, onde passavam suas horas de verão.

Entre os diversos encontros que se sucedem, os irmãos Adrienne (Juliette Binoche), uma designer que mora em Nova York, Frédéric (Charles Berling) economista e professor universitário em Paris, e Jérémie (Jérémie Renier), um empresário dinâmico que vive na China, passam a confrontar o final da infância, as memórias partilhadas, a visão sobre passado e futuro, descobrindo que não têm mais tantas afinidades assim. A vida e os relacionamentos, tal com as obras de arte, se transformam com o passar do tempo.

A história em torno desses personagens parece simples. Os dramas pessoais são revelados aos poucos nos diálogos. Da mesma forma, trazem a presença da casa e do tio falecido. Cada pintura, artefato, móvel art décor e canto da casa contam uma história, revelam segredos, fazendo dela um personagem à parte, numa região coberta de vegetação e lirismo.

Sobre a situação sócioeconômica, "Horas de Verão" pode ser visto como um lamento do diretor pelo descaso à memória cultural francesa. No filme, os personagens principais são a nova geração de uma família que descende da aristocracia francesa e estão na posse de alguns artefatos inestimáveis de importância nacional, mas de alguma forma a ideia de dividir os pertences é tão universal. O nacionalismo parece navegar num processo de luto (arte e história) para a globalização, que nunca está satisfeita - e que existe com magra qualidade do material, apesar do denso e longo alcance do espaço que ocupa.

Filho do roteirista Jacques Rémy (1910-1981), Assayas começou no cinema como crítico da revista “Cahiers du Cinema”, em 1979, quando ainda era estudante. Em 1985 assinou o roteiro de “Rendez–Vous”, de André Techiné, exibido na 10ª Mostra Internacional de São Paulo. No ano seguinte, dirigiu “Désordre”, seu primeiro longa. Seus demais trabalhos são conhecidos pelo público paulista graças à Mostra. Com exceção de “Clean”, de 2004, com o qual ele concorreu em vão à Palma de Ouro em Cannes.

Para Assayas a revista “Cahiers du Cinema” foi uma escola, pois considera fazer cinema e pensar cinema uma mesma coisa, como duas etapas de um mesmo processo criativo. Não por acaso, tenta responder em seu cinema, questões que herdou como crítico. Com Horas de Verão, ele focaliza a atenção nas vidas internas secretas de mulheres, sem deixar de fazer perguntas duras que são universal a ambos os sexos: Onde está o lar? O que fazemos nós com as posses de gerações agonizantes? Lugares e objetos sustentam um tipo de vida emocional depois que os donos originais os abandonaram? Famílias podem ser sustentadas por gerações em um mundo onde ninguém fica mais no mesmo lugar por mais de alguns meses?




Onde encontrar: E o Vídeo Levou.

segunda-feira, 7 de março de 2011

O Calor do Frio

Resenha Crítica do filme "Inverno da Alma"
Daniel Rodrigues*

Há um profundo amor quase impenetrável nos meandros de determinadas obras. Como na peça “Dois Perdidos Numa Noite Suja”, de Plínio Marcos, no conto “Chacais e Árabes”, de Franz Kafka, ou filmes como “O Rito”, de Ingmar Bergman; obras duras. Tão intrincados de perscrutar que a própria manifestação afetiva, vencida por motivos indignos, parece nem existir. Mas ela está lá, mais viva que se possa sugerir à primeira vista. É o caso de “Inverno da Alma” (Winter's Bone, 2010), da diretora Debra Granik, cujo enredo evoca sentimentos motivadores genuínos, mesmo que encobertos de rancores, medos e inseguranças próprios do ser humano.

Premiado em Sundance e Berlim, o filme conta a história de Ree Dolly (Jennifer Lawrence, indicada ao Oscar de Melhor Atriz), uma jovem de 17 anos cuja imensa responsabilidade de gerenciar com parcos recursos uma casa com dois irmãos pequenos e uma mãe mentalmente doente é ainda mais dificultada quando ela se vê necessitada a encontrar seu desaparecido pai, Jessup Dolly, depois que ele usa a mesma casa como forma de garantir sua liberdade condicional. Diante da possibilidade de perder o teto, Ree desafia os códigos e a lei do silêncio do inóspito e gélido vilarejo onde moram arriscando a vida para salvar sua família. Os receios e as autoproteções dos que, de alguma forma, estiveram envolvidos com seu criminoso pai, então, começam a se manifestar na forma de mentiras, fugas e agressividade.

Ree aborda várias pessoas na tentativa de encontrar Jessup. Mesmo assim, o fato de seu pai ter dívidas com muita gente parece tornar as barreiras para a verdade intransponíveis. Mas só parece. Um dos elementos utilizados pela diretora para narrar a história com sua lente segura e rigorosa são as diversas portas daquelas simples casas, ao mesmo tempo protetoras dos frios do inverno e da alma. A cada abordagem atrás de ajuda, a protagonista lança-se numa busca onde é preciso transpor as “portas” daquele “íntimo coletivo” magoado e culpado – e, por isso, instintivamente hostil.

Na primeira metade do filme, por mais que pudesse adentrar em algum lar, a tentativa é sempre nula, como se a esperança de chegar a seu único objetivo (encontrar o pai vivo ou morto) fosse imediatamente negada. Passagens que se fechavam. No entanto, o elemento simbólico dessa busca mantém-se na persistência da personagem, e é então que as atitudes passam a gerar consequências, e as soluções, de forma amarga e realista, aparecem. Seu próprio tio, Teardrop (o ótimo John Hawkes, concorrente ao Oscar de ator coadjuvante), irmão de Jessup (e tão “durão” quanto o consanguíneo), que de início lhe negara apoio, tentando com brutalidade demovê-la da empreitada, é quem, depois, convencido a ajudar a sobrinha, busca-lhe na casa dos inimigos com a verdadeira intenção de, a partir dali, protegê-la.

Impossível não referenciar ao cinema iraniano, como aos cineastas Abbas Kiarostami ou Mohsen Makhmalbaf, cujas obras são marcadas pelos elementos representativos da busca por alguma coisa que, material ou não, direcionam o olhar do espectador a encontrar junto com os protagonistas aquele algo que existencialmente lhes faz falta. E, de fato, é o que procuram. Os road movies “Vida e Nada Mais” (1992) e “Gosto de Cereja” (1999), de Kiarostami, ou “Um Instante de Inocência” (1996), de Makhmalbaf, vão bastante nesta linha.

A fotografia entre o azulado e o acinzentado de “Inverno da Alma”, ressaltando a seca floresta de altos e opressores pinheiros, imprime uma sensação de solidão e mistério, pontuado por uma câmera quase que invariavelmente estática e uma trilha sonora econômica, usada para marcar momentos-chave da trama. Um pouco como “Fargo”, dos irmãos Coen (1996), inocência e subversão convivem num microuniverso à parte de tudo, escancarando um ser norte-americano interiorano longe dos belos tipos de Nova York ou Los Angeles comercialmente vendáveis ao mundo. Aqui, não: são gentes pobres e feias, enrugadas, de peles e cabelos maltratados, vestidas de jeans surrados e sem nenhum sinal de sensualidade (chega a ser estranho ver um filme americano onde nada é erotizado...).

É neste pequeno mundo que, impulsionada por um desejo convicto, Ree enfrenta com coragem suas manifestas limitações: a solidão da liderança, a angústia diária da vida pobre, os medos interiores, a fragilidade física de menina num ambiente bruto. Isso, motivada pela autoproteção e pelo amor sincero – mesmo sem sorrisos – aos que lhe dependem. Ela transforma, assim, aquela realidade aparentemente congelada pelo frio dos corações. Jessup, segundo o irmão, não tivera essa força interna para conseguir desviar-se da contravenção e viver em paz com os filhos que tanto amava. Essa ternura descomplicada de Ree se estende não só aos irmãos e a mãe, mas à sombria figura do pai, a quem a investigação acaba por abrir espaço a um novo e inesperado motivo, identificando-o tanto na figura do tio (durão, mas, no fundo, um “coração mole”) quanto no significado que a própria busca em si lhe representa: um encontro consigo mesma. Tal pai, tal filha.

Há uma cena em que Ree folheia com os irmãos um álbum de fotografias onde reveem fotos da família. Numa delas, está o pai, jovem e feliz ao sol. Segundo Ree, quando tinha sua idade. Essa identificação parece, aos poucos e inconscientemente, funcionar como libertadora da jovem quanto às pré-concepções de sua origem nefasta, tão alardeadas e imputadas por todos como sendo inatas dos Dolly.

Curiosamente, a forma como a Ree prova a morte do pai para, enfim, poder ficar com a casa, é levando ao delegado as mãos do morto, cortadas por uma motosserra. E por serem justamente as mãos, o aspecto do inatismo reaparece como metáfora, lembrando a dicotomia levantada por um dos clássicos do cinema expressionista alemão, “As Mãos de Orlac – O Calvário de Um Artista”, de Robert Wiene (1924) – mesmo diretor do essencial “O Gabinete do dr. Caligari”. No filme, o pianista Paul Orlac sofre um acidente de trem onde perde as mãos. Na cirurgia de emergência, transplantam-lhe as mãos do assassino Vasseur, que acabara de ser executado. Ao saber disso, o sensível músico entra em um grande conflito interno que o leva à loucura: passa a, igualmente ao “dono” das mãos, matar com elas. As mãos de Orlac assumem o caráter de um símbolo: instrumentos da vontade que comanda o fazer, pelo qual o homem revela sua humanidade ou desumanidade, elas são um signo material do sujeito, tanto como objeto da expressão dos sentimentos quanto demonstração objetiva da personalidade.

Não à toa, é com um pequeno toque no ombro do seu tio que Ree, mesmo temerosa, demonstra-lhe empatia, firmando ali o elo emocional entre os dois. Ao tomar consciência da própria personalidade, as coisas começam a tomar rumos que, de uma forma ou outra, acabam se encaixando. Pela iniciativa de alguém para mudar o cenário, os corações, agora timidamente sorridentes, parecem motivar-se a se aquecer. Vida e nada mais.

Sobre a diretora

A americana Debra Granik, nascida em Cambridge, Massachusetts, tem uma curta e já premiada carreira. Formada em cinema pela Tisch School of the Arts (New York University), fora as já citadas premiações e indicações de “Inverno da Alma” (além da principal indicação ao Oscar, a de Melhor Filme), Debra ganhou, na sua estreia atrás das câmeras o prêmio de Melhor Curta-Metragem para seu “Snake Feed” no Sundance Film Festival de 1998. Ligada ao cinema independente, “Inverno da Alma” é recém seu segundo longa. Seu primeiro, “Down to the Bone”, de 2004, sobre uma mulher presa em um casamento que luta para criar seus filhos e controlar o hábito secreto de se drogar, deu a ela o prêmio de Melhor Diretora de Filme Dramático também em Sundance.

A considerar seus dois longas, percebe-se um olhar bastante humanístico e sensível sobre questões muitas vezes obscuras da sociedade norte-americana, como os vícios, as desarticulações familiares da vida moderna e as pressões psicológicas impostas pela por esta sociedade. Longe da exuberãncia fotográfica e mais próxima das composições plásticas precisas, o estilo de Debra, anteriormente formada em Política, vale-se desta visão mais ampla para direcionar suas lentes a questões socioeconômicas que operam do externo para o interno, motivando, a partir daí, a consequências mais profundas e íntimas dos personagens.

*Jornalista, apoiador do Ciclo.