segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O lago obscuro de Darren Aronofsky. Um olhar sobre 'Cisne Negro'.

Isabel Ferlini

Darren Aronofsky sempre teve queda para contos que se debruçam sobre a dicotomia mente versus corpo, e o flagelo destrutivo que provoca no próprio ser. Essa procura incessante entre os limites da nossa forma física, perante as possibilidades infinitas do que o nosso intelecto pode alcançar, tornou-se quase uma obsessão do realizador. A perfeição e a autodestruição na sua procura são destaque no impressionante 'Réquiem Para Um Sonho' (2000), em 'A Fonte' (2006). E, agora, em 'Cisne Negro', o seu mais recente filme estreado.

Uma pena é o que Darren faz com o balé. Baseado na obra de Tchaikovsky, o diretor mutila O Lago Dos Cisnes. Uma história triste, mas bela pela arte que expressa, vira trágica e obscura. Essa ‘aversão’ de Darren tem o propósito de salientar psique conturbada da bailarina Nina (Natalie Portman). 

O filme é contado sob o ponto de vista de Nina, cuja magreza excessiva, voz trémula e olhares expressam fragilidade exterior. Todos os outros quatro personagens que a influenciam,  como sua mãe (Barbara Hershey), o diretor Thomas (Vincent Cassel), a aposenta estrela do grupo Beth (Winona Ryder) e sua colega Lily (Mila Kunis) giram em torno dela. Uma relação de desejo e repulsa, como se fossem ambigüidades de Nina.

"Não é preciso só técnica.", diz o diretor para a bailarina. Ironicamente, é isso que faz o filme interessante. Técnica e jogos de espelhos. A brilhante trilha sonora, os rúidos, vultos entre cortinas, as alucinações e metamorfose da bailarina. A obsessão pelo perfeccionismo é o mote do filme. Desde o início e com muita freqüência, o engenho visual, diálogos e ações nos indicam e são medidos para isso. Com efeito, a mãe de Nina (Barbara Hershey) ganha e preenchem a cena em diferentes momentos. Mas sua expressividade é limitada para salientar a magreza de feições e obscuridade da filha.

Como em ‘O Sonho de Cassandra’, de Woody Allen, a história não traz grandes surpresas. Cheio de momentos de boa dramaticidade, 'Cisne Negro' causa enjôos e náuseas. Mas desmerece qualquer expectativa no grand finale.  Excelente elenco. Pouco encontro e entrega.

Ah, se Hitchcock estivesse vivo...

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Para os admiradores de balé no cinema, indico ‘Carmen’, do espanhol Carlos Saura. Assistir a este filme deu vontade de rever ‘Carmen’. Numa tristeza de maior grandeza, Saura consegue que personagens e atores atuem tanto dentro como fora de cena, sem desmerecer um pelo outro. Todos estão (e são) Carmen.

Um comentário:

Cly Reis disse...

Muito boa a resenha. Concordo com alguns pontos, discordo de outros mas o importante é exatamente esta diversidade de opiniões. Achei o filme bem menos apreciável do que você. Realmente muito previsível para um filme que se propõe a ser um thriller.
Saí do cinema exatamente com as duas últimas impressões manifestadas no post: imagina um filme desses com um Hitchcock. Não precisava nem ser le, podia ser um dos 'filhotes', truffeut, De Palma... Esses sim saberiam o que fazer.
E a outra impressão é que grandes diretores (como Saura em "Carmem") conseguem tirar o melhor da dança, do envolvimento, da rotina de uma companhia com as relações suas humanas em um filme. E não é o caso do sr. Aronosfky, infelizmente.

abraço e parabéns pelo blog

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